Os habitantes da Faixa de Gaza, território palestino no Médio Oriente, vivem dias de desespero. Enquanto a incursão israelita pode acontecer a qualquer momento, alguns tentam fugir da morte, mas não veem uma saída possível.
Neste contexto, o e-Global entrevistou o Vice-Presidente do Movimento pelos Direitos do Povo Palestino e pela Paz no Médio Oriente (MPPM), Carlos Almeida.
e-Global: Pode começar por explicar o que é o MPPM, para quem ainda não conhece este movimento?
Carlos Almeida: O MPPM – Movimento pelos Direitos do Povo Palestino e pela Paz no Médio Oriente – é um movimento de opinião pública solidário com a causa nacional do povo palestino e que entende que esse desígnio é indissociável da paz na região do Médio Oriente.
O MPPM foi fundado em 2005, constituiu-se como associação sem fins lucrativos em 2007 e foi acreditado pelo Comité das Nações Unidas pelo Exercício dos Direitos Inalienáveis do Povo Palestino em 2009. O MPPM orienta-se pelos princípios da Carta das Nações Unidas, do Direito Internacional e do Direito Internacional Humanitário.
Como o MPPM analisa (tendo em conta a História da região) o conflito que está a decorrer em Israel, após o ataque do Hamas a 07 de outubro?
Os acontecimentos do dia 07 de outubro comprovam, da forma mais trágica e dramática, que nenhum Estado, por mais forte e poderoso militarmente que seja, pode perpetuar um regime de ocupação, colonização, limpeza étnica e discriminação sobre um povo, assente na violência quotidiana, em massacres e actos de guerra, e, ao mesmo tempo, garantir a segurança aos seus cidadãos.
“(…) a comunidade internacional e organismos internacionais, a começar pela Organização das Nações Unidas, têm uma enorme responsabilidade que não estão a ser capazes de assumir.”
E que a comunidade internacional e organismos internacionais, a começar pela Organização das Nações Unidas, têm uma enorme responsabilidade que não estão a ser capazes de assumir. Tem sido pela sua inacção, quando não, tantas vezes e em tantas situações, pela cumplicidade de alguns, que Israel tem prosseguido a sua política de ocupação e humilhação do povo palestino.
O drama que se vive todos os dias nos territórios palestinos, ocupados por Israel em 1967, o massacre que está em curso em Gaza, tornam urgente que o mundo se mobilize na construção de uma solução política para a questão palestina, que, para ser viável, só pode ser fundada no direito internacional, nas resoluções pertinentes das Nações Unidas.
O que pensa sobre o Hamas?
O Hamas é uma organização palestina, entre outras, muitas outras, organizações e movimentos da resistência nacional palestina. Venceu as últimas eleições realizadas nos territórios palestinos ocupados em 1967, que o mundo considerou unanimemente como livres e justas.
“(…) os Estados Unidos e a União Europeia decidiram isolar o Hamas, castigando o povo palestino pela sua escolha (…)”
Nessa ocasião, os Estados Unidos e a União Europeia decidiram isolar o Hamas, castigando o povo palestino pela sua escolha – o que veio a traduzir-se no bloqueio imposto à Faixa de Gaza, que persiste desde 2007 – e comprometendo decididamente as possibilidades de uma vida política democrática, que sempre seriam – como são – limitadas pela própria existência da ocupação.
“(…) o Hamas não pode ser ignorado no processo que deve conduzir a uma solução justa para a questão palestina.”
Na medida em que isso resulte da escolha livre do povo palestino, enquanto força política, o Hamas não pode ser ignorado no processo que deve conduzir a uma solução justa para a questão palestina.
O que tem sentido o MPPM ao ver as imagens violentas do conflito?
Um grande sentimento de urgência sobre a necessidade de travar o massacre, de parar de uma vez com este ciclo de violência interminável que todos os dias destrói vidas humanas, que todas as vidas, mesmo todas, devem ser respeitadas. E que tal só é possível quando o povo palestino vir reconhecidos os seus imprescritíveis direitos nacionais.
Como espera que o Estado da Palestina aja perante o que se está a passar?
Caberá às lideranças e às organizações de resistência nacional encontrarem os caminhos que entenderem justos e apropriados, tendo em vista a realização dos seus objetivos nacionais. Do que temos plena convicção é de que, em nenhuma circunstância, o povo palestino aceitará o silenciamento e a humilhação a que está sujeito, pelo menos, desde há 75 anos.
E o que pensa sobre a atuação de Israel em resposta ao ataque do Hamas?
O que está a acontecer em Gaza preenche todos os critérios previstos na Convenção das Nações Unidas para a Prevenção e a Repressão do Crime de Genocídio, aprovada por unanimidade na Assembleia Geral das Nações Unidas no dia 09 de dezembro de 1948.
“Todos, incluindo o Governo Português, que repetiram mecanicamente a frase ‘Israel tem o direito de defender-se’, sabiam, sabem, que era isto que ia acontecer.”
O que está a acontecer, já hoje, é um genocídio, e o mundo sabe-o. Todos, incluindo o Governo Português, que repetiram mecanicamente a frase “Israel tem o direito de defender-se”, sabiam, sabem, que era isto que ia acontecer.
Israel mantém, desde a sua criação, uma atitude permanente de desafio e desrespeito pelo direito internacional. Todos os dirigentes políticos sabem que Israel sempre rejeitou a aplicabilidade, à situação nos territórios palestinos ocupados, das Convenções de Genebra sobre Direito Humanitário Internacional, e muito em especial da IV Convenção, relativa à proteção de civis em tempo de guerra.
Pode dar-me mais pormenores sobre a concentração realizada na tarde da passada quarta-feira, 11 de outubro, na Praça Martim Moniz, em Lisboa?
Foi um momento importante de expressão da opinião pública em Portugal com a causa nacional palestina e a necessidade de parar o massacre que está em curso.
“É a nossa democracia, também, que está em causa, e é nosso dever defendê-la.”
Num tempo em que, um pouco por toda a Europa, se procura criminalizar quem expressa a sua solidariedade com a causa de um povo que é vítima de ocupação, colonização e limpeza étnica – proibindo-se manifestações e o uso da bandeira palestina – e quando alguns aqui, no nosso país, apelam a que Portugal siga esse mesmo caminho, esta iniciativa, como a que temos agendada já para amanhã, terça-feira, dia 17 de outubro, às 18 horas, no Porto (Rua Fernandes Tomás com Rua do Bolhão), e na próxima quarta-feira, dia 18 de outubro, em Lisboa, no mesmo local e à mesma hora da anterior (Praça Martim Moniz, 18 horas), são também, além de uma manifestação de solidariedade, um acto cívico de afirmação de liberdade.
É a nossa democracia, também, que está em causa, e é nosso dever defendê-la.
Cátia Tocha
One Comment
Espanta me totalmente este tipo de visão sobre o assunto, não a forma de ser tolerante com tal.