Umaro Sissoco Embaló, declarado pela Comissão Nacional de Eleições (CNE) vencedor das eleições de 29 de Dezembro, foi investido esta quinta-feira, 27 de Fevereiro, como Presidente da República. O acto de investidura, que ocorreu sem o aval do Supremo Tribunal de Justiça que recebeu dia 26 o recurso da candidatura de Domingos Simões Pereira, do Governo e da maioria dos deputados, foi presidido pelo vice-presidente da ANP, Nuno Gomes Nabian. No seu discurso de investidura, Umaro Sissoco Embaló prometeu combater o desnorte, banditismo e a corrupção governativa que assolaram o país nos últimos anos.
Contra todas as expectativas, sobretudo as ligadas à componente legal e da segurança, mas sobretudo face à possibilidade do Governo intervir para tentar impedir o acto, Umaro Sissoco Embaló cumpriu a promessa de ser investido a 27 de Fevereiro, com ou sem aval dos demais órgãos de soberania. A cerimónia ocorreu num dos hotéis da capital e contou com a presença do Procurador-Geral da República, do Presidente da República cessante, José Mário Vaz e do Presidente do Tribunal de Contas.
Antecedido de muita polémica, sobretudo a nível da Assembleia Nacional Popular (ANP) e do Governo, que foi obrigado a realizar uma reunião do Conselho Nacional de Segurança numa tentativa de garantir a fidelidade dos militares e polícias ao poder político instalado, a investidura foi uma realidade e teve forte aparato das Forças de Defesa e Segurança.
À saída da reunião do Conselho Nacional de Segurança, realizada no dia anterior, o primeiro-ministro Aristides Gomes garantira que qualquer acção de provocação sobre a posse teria a resposta necessária, criando assim a expectativa junto da população. O Chefe do Governo disse ainda que, qualquer tentativa da investidura seria interpretada como um “golpe de Estado”.
A mesma interpretação foi manifestada pelo presidente da ANP, Cipriano Cassamá, que mesmo presente no país, viu o seu vice-presidente convocar a reunião da Comissão Permanente da ANP e marcar a sessão especial para a investidura. Na noite de quinta-feira, o gabinete do Presidente da ANP emitiu um comunicado a informar sobre a sua disponibilidade para trabalhar, mas alerta que a convocação da sessão especial para a investidura dependerá da posição do Supremo Tribunal de Justiça face ao contencioso.
“Maioria parlamentar se deslocou”
Reinterpretando a formalidade normativa para a tomada de posse do chefe de Estado, Nuno Nabian investiu Umaro Sissoco como Presidente da República. A cerimónia foi totalmente organizada por Umaro Sissoco Embaló e pelo seu staff. A primeira fase da organização da cerimónia de investidura foi frustrar a tentativa do Governo em proibir a realização do acto numa unidade hoteleira. Numa carta dirigida à secretaria de Estado do Turismo, a ANP negou ter solicitado a sala para a reunião, como consta na convocatória assinada por Nuno Nabian.
Ultrapassadas todas as barreiras, e quase sem qualquer perturbação, a cerimónia iniciou-se com apenas uma hora de atraso. Umaro Sissoco Embaló chegou na hora prevista, mas José Mário Vaz atrasara-se. O PR cessante só chegou quando já eram 12:00 horas e foi fortemente ovacionado pelos presentes na dupla sala da unidade hoteleira.
A mesa da ANP, que presidiu a cerimónia, contou com Adja Satu Camará, segunda vice-Presidente e se coptaram mais dois deputados para fazerem de primeiro e segundo secretário, já que os titulares dos respectivos postos são deputados do PAIGC que boicotaram o acto, que qualificaram de “golpe de Estado”.
No seu discurso, Nuno Nabian realçou mais uma vez que, na indisponibilidade do presidente da ANP, Cipriano Cassamá, em atender o pedido de convocação da Comissão Permanente para depois deliberar sobre uma sessão especial, foi obrigado a título regimental a assumir as rédeas dos trabalhos, principalmente nas competências que lhe são delegadas pelo Presidente.
Justificando a legitimidade de presidir o acto, na sua opinião e apesar de ter a presença de apenas 50 deputados, Nuno Nabian frisou no seu discurso que, a realização da cerimónia “é prova que a maioria parlamentar se deslocou”.
“O Presidente da ANP recusou convocar a reunião da Comissão Permanente, porque sabe que não tem o controlo da maioria dos deputados. Todos viram que, na Comissão permanente com 15 elementos, 12 estiveram presentes e deliberaram”, destacou Nuno Nabian.
Nuno Nabian acusou igualmente o Governo de estar a atrasar os trabalhos, porque tem o controlo de algumas instituições, tais como o Supremo Tribunal de Justiça que, segundo Nabian, tem actuado com muita tendência neste processo.
“Temos que reerguer o Estado”
Para Umaro Sissoco Embaló e os partidos que o apoiaram, a crise acabou. Antes de Sissoco Embaló prestar juramento, o primeiro secretário coptado, Mamadú Serifo Djaquité, deputado do MADEM leu a acta do apuramento nacional realizado pela CNE a 25 de Fevereiro.
A referida acta de apuramento contém os dados que a CNE considera válidos, mas que estão a ser contestados pela candidatura de Domingos Simões Pereira. Uma das denúncias que a candidatura de Domingos Simões Pereira fez, e que ganhou ecos nos últimos dias, é o facto da CNE, segundo Mário Lino da Veiga, ser incapaz de apresentar as actas descritivas de 8 regiões eleitorais das dez existentes.
Para muitos dos presentes as atenções estavam voltadas para o discurso de Umaro Sissoco que depois das saudações, afirmou que o seu objectivo estratégico é “combater o banditismo político, a desordem e o desnorte”, que para o Umaro Sissoco são os responsáveis do colapso do Estado guineense. “Agora é a minha missão com o apoio de todos vocês reerguer este Estado”, prometeu Sissoco Embaló.
Com um discurso ‘combativo’, em que não evitou muitas indirectas para os seus adversários, assumindo-se como promotor da Reconciliação Nacional, Umaro Sissoco garantiu que a sua acção vai pautar pela verdade e transparência. “Temos que credibilizar a imagem da Guiné-Bissau e fazer o país ser respeitado”, prometeu o mais novo Chefe de Estado alguma vez eleito no país.
A linha do discurso de Umaro Sissoco Embaló, eleito com 53,55% de votos, segundo a CNE, foi uma mistura daquilo que defende que deve ser feito, sem perder de vista as responsabilidades que os seus adversários têm de assumir. Tal como ficou patente numa das suas passagens em que defende a “construção de um Estado novo”, mas avisa que “a lei deve imperar”.
“Nesta minha presidência, José Mário Vaz será a minha referência. Será o meu Conselheiro”, disse para interromper e gritar “Nunca!”, palavra que notabilizou o ex-Chefe de Estado quando impôs que “Nunca” Domingos Simões Pereira ocuparia o cadeirão presidencial.
JOMAV sai com passadeira estendida
Umaro Sissoco disse ter uma agenda na qual prestará uma atenção especial às mulheres e jovens, e prometeu dirigir o Conselho de Ministros para tratar deste assunto. Mas também, insistiu em sublinhar, que vai ser um Presidente da República para “dirigir todas as etnias na Guiné-Bissau”, tendo citado os nomes das principais etnias no país.
Terminada a posse, Umaro Sissoco deslocou-se ao Palácio Côr de Rosa (Palácio da República) acompanhado de José Mário Vaz para assinalar a saída do ex-Chefe de Estado, acompanhado da esposa. José Mário Vaz com a esposa Rosa Vaz, saiu numa passadeira estendida e sob fortes aplausos daqueles que acompanharam Umaro Sissoco, dirigentes do MADEM, PRS e alguns da APU-PDGB. Para estes, José Mário Vaz fez história ao “impedir a ditadura do PAIGC” e de ter sido o “único que levou o seu mandato até ao fim”.
A investidura teve lugar, mas o país continua à espera da decisão do STJ sobre o recurso interposto pelo candidato Domingos Simões Pereira.