Um tribunal australiano recusou que o julgamento sobre o caso de escutas ilegais australianas ao Governo timorense fosse feito à porta aberta, um pedido que foi efetuado pela defesa dos dois homens que denunciaram a espionagem. Esta decisão de não aceitar o pedido foi tomada pela juíza Lorraine Walker, do tribunal de Camberra, na sexta-feira, 09 de novembro, uma vez que a audiência inclui informação de segurança nacional, que terá de fazer parte do processo.
A magistrada admitiu que a legislação que permite que o julgamento decorra à porta fechada pode ser “claramente prejudicial aos réus”, uma vez que os advogados de defesa “podem não ter o direito de estar presentes” se não tiverem uma credencial de segurança. Apesar dos advogados da “Testemunha K” já terem autorização para conhecer a identidade do arguido, os advogados de Collaery ainda não tiveram a obtiveram.
Para a Aliança de Advogados Australianos, o caso não devia avançar. No entanto, caso aconteça, deveria ser feito um “processo transparente com um tribunal aberto”, disse o porta-voz da organização, Greg Barns. Os próximos passos dependem da decisão do procurador-geral, Christian Porter, emitir ou não um certificado de não divulgação, o que obrigaria a audiências à porta fechada para não prejudicar a segurança nacional.
O caso envolve uma denúncia feita pela “Testemunha K”, um ex-agente dos serviços secretos australianos que divulgou um esquema de escutas montado em 2004 pelos serviços secretos australianos em escritórios do Governo timorense, em Díli. Foi através dessas escutas que o Governo australiano conseguiu ter acesso a informações que permitiriam favorecer as intenções australianas nas negociações com Timor-Leste da fronteira marítima e pelo controlo da zona Greater Sunrise, uma rica reserva de petróleo e gás. Tanto “K”, cuja entidade se desconhece, como o seu advogado, Bernard Collaery, estão acusados de conspiração pelas autoridades em Camberra, um crime que tem uma pena máxima de dois anos de prisão.
Recorde-se que a revista online australiana “Crikey” publicou no mês passado, dia 29 de outubro, um artigo onde mencionava uma lista de altos responsáveis de Timor-Leste que terão beneficiado com o encobrimento do caso de espionagem ao seu país quando este e Austrália estavam a negociar sobre o Mar de Timor. “Sob o pretexto da segurança nacional, os procuradores querem conduzir o julgamento fora da vista do público para evitar o constrangimento – e talvez pior – de várias pessoas, enquanto os advogados de K e Collaery argumentam que a acusação deve ser conduzida em audiência pública”, pode ler-se nesse artigo.
Na lista estão 11 nomes, entre eles o do ex-primeiro-ministro australiano, John Howard, e o do ex-ministro dos Negócios Estrangeiros, Alexander Downer, tendo ambos sido os responsáveis pelos setores judiciais e da secreta. Além destas figuras políticas, também a petrolífera Woodside se encontra no documento divulgado, sendo considerada “o maior beneficiário de todo o escândalo”, tendo dado emprego a “funcionários do Departamento de Negócios Estrangeiros e Comércio”, e até mesmo a Alexander Downer.
Os restantes indivíduos envolvidos são o ministro dos Negócios Estrangeiros, Bob Carr, na altura da denúncia timorense, o diretor-geral dos serviços secretos e chefe da ASIS, Nick Warner, que bloqueou a devolução do passaporte à ‘Testemunha K’, a diretora da procuradoria Pública, Sarah McNaughton, o atual procurador-geral, Christian Porter, que ordenou a acusação aos dois homens, e o procurador-geral Mark Dreifys, que aprovou as escutas à ‘Testemunha K’ e a Bernard Collaery, além de David Irvine, o responsável da ASIS nessa época. Fazem ainda parte da lista a embaixadora da Austrália em 2004 no período das escutas a Timor-Leste, Margaret Twomey, e o ex-procurador-geral George Brandis, que ordenou rusgas a ‘K’ e ao escritório e casa de Collaery, tendo “ameaçado Collaery no parlamento”.