O Golpe de Estado de no Níger de 26 de Julho de 2023, encabeçado pelo General Abdourahamane Tchiani, aliás Omar Tiani, contra o presidente Mohamed Bazoum, teve como um dos efeitos imediatos a suspensão de alguns acordos que tinham sido firmados com grupos armados. Entre estes destaca-se a União das Forças Patrióticas para a Refundação (UFPR) de Mahmoud Salah que aceitara abandonar a luta armada dois meses antes do Golpe de Estado.
Mahmoud Salah disse à e-Global que não reconhece as novas autoridades nigerina, acusa o antigo presidente Mahamadou Issoufou de possível cumplicidade com os golpistas, e considera que a alternativa armada, através da FPL (Frente de Libertação Patriótica), é a única via para o regresso do presidente Mohamed Bazoum e restauração da ordem Constitucional.
Como caracteriza a situação vigente no Níger?
Mahmoud Salah: A FPL (Frente de Libertação Patriótica) deplora esta situação imposta ao povo nigerino por um pequeno grupo de indivíduos mal-intencionados. Todos nós conhecemos estes indivíduos, eles têm rostos, têm nomes e todos os nigerianos os conhecem. Estes indivíduos, pelos seus interesses egoístas, decidiram mergulhar o país no caos e tomar o seu povo como refém. Desde 26 de Julho que o povo nigerino sofre as consequências desta situação. Hoje o país está isolado e a situação dos cidadãos nigerinos deteriora-se dia após dia.
A situação securitária também tem degradado cada dia que passa, e os ataques contra as forças de defesa nigerinas são cada vez mais frequentes. Este Golpe não melhorou nada, pelo contrário, mergulhou-nos numa situação pior que em 2021. Quando realço 2021, refiro-me ao período de Mahamadou Issoufou que liderou o país de 2011 a 2021. E sob a sua presidência, que durou dez anos, assistimos a massacres das forças de defesa e segurança e em cada ataque morriam centenas de pessoas, militares e civis.
Desde que Bazoum chegou ao poder entramos num período de acalmia, e isso tem de ser reconhecido.
Nós criamos a UFPR (União das Forças Patrióticas para a Refundação) no final de 2019 para precisamente nos opormos à governação de Issoufou que era de natureza clânica e sectária com interesses apenas financeiros. Foi contra esse sistema e regime que pegamos nas armas, apelando às forças de defesa e segurança para que assumissem as suas responsabilidades. Não o fizeram até que Mohamed Bazoum foi eleito em 2021 quando já estávamos na clandestinidade. Foi a partir das nossas bases que acompanhamos a tomada de posse de Bazoum ao cargo supremo do nosso país, foi aí também que ouvimos o seu discurso no qual prometeu justiça ao povo nigerino, a luta contra a corrupção e contra a má governação. Nessa altura éramos considerados rebeldes e um movimento político-militar, mas acompanhamos atentivamente a governação de Bazoum e esperamos poder confirmar se iria de facto respeitar os seus compromissos.
Efectivamente, dois anos depois, nós constatamos que, em termos de luta contra a corrupção, Bazoum aplicou as suas promessas e chegou mesmo a mandar prender alguns membros do seu próprio partido. O que era impossível durante o reinado de Issoufou. Bazoum criou também as condições para que houvesse uma relativa calma em termos da segurança. Houve cada vez menos ataques e cada vez menos massacres. Também criou as condições para que os bens públicos não fossem desviados. Perante tudo isto consideramos que era o momento para depormos as armas e ajudar o presidente. Foi em Maio que concordamos em firmar a paz incondicionalmente, mas apenas dois meses depois, soldados oportunistas controlados por políticos desonestos e corruptos decidiram derrubar o presidente, sequestrá-lo e o manter, juntamente com a sua familia, refém.
Isto é inédito no Níger. Mas o presidente, com a sua sólida determinação, recusou abdicar. E aqui está o General Abderahmane Tchiani, em vez de reformar-se, impõe-nos a sua vontade. Consideramos que esta situação é lamentável e que nos faz retroceder 10 anos e terá consequências catastróficas. Isto é um revés para a democracia e unidade nacional. O país tornou-se refém de dois homens. Issoufou, que recusa deixar o poder, e o seu capanga Tchiani, que executou o golpe de Estado.
Quais são as exigências imediatas da FPL?
Como o motivo deste golpe foi para frustrar a estratégia de Bazoum no combate à corrupção, e num momento em que estava a dar seguimento a todos os dossiers, inclusivamente casos que implicavam muitos generais. Mas também casos em que o ex-presidente [Issoufou Mahamadou] está envolvido, assim como sua esposa e filhos. Portanto, a luta contra a corrupção tem de prosseguir e sem falhas. Este constitui o nosso principal objectivo, ou seja, a justiça tem de prosseguir o seu trabalho.
Para nós o mais importante é que o país avance e o combate à corrupção seja eficaz, que acabe a injustiça e a má governação que assolou os 10 anos de reinado de Mahamadou Issoufou. Era esse trabalho que Bazoum estava a fazer. Enquanto o presidente Bazoum permanecer com a mesma linha mestra de governação e de combate à corrupção, continuaremos a o apoiar.
Este golpe foi levado a cabo para satisfazer Mahamadou Issoufou, que poderá regressar ao poder para continuar a sua acção predadora. Nunca aceitaremos isso e estamos preparados para agir consequentemente.
A sua organização está pronta regressar à luta armada?
Estamos a preparar o nosso movimento para agir de acordo com a situação actual do país. Enquanto não houver solução e enquanto o Presidente da República [Mohamed Bazoum] não for libertado e reposto nas suas funções, assim como, enquanto não for restabelecida a ordem institucional e democrática, porque tudo o que nos une é a Constituição, não nos calaremos. Se isso não for feito, eles terão de nos enfrentar.
Nós vamos entrar em confronto e será uma chacina. Eles serão os responsáveis. Mas podemos evitar massacres, basta que os Golpistas se comportem como bons cidadãos e libertem o Presidente da República [Mohamed Bazoum]. A violência apenas gera violência. Até serem satisfeitas as nossas exigências, o nosso compromisso com a luta armada permanecerá inalterável.