Dois dias antes da comemoração dos 50 anos da Revolução do 25 de Abril, o Presidente português, Marcelo Rebelo de Sousa, disse que Portugal “assume toda a responsabilidade” dos “crimes cometidos” durante a escravatura e da era colonial, e destacou a necessidade de reparações.
Reparações que o presidente português já sugerira em 2023, na Assembleia da República, durante a visita a Portugal do presidente brasileiro, Inácio Lula da Silva.
Para Raul Tati, professor de História e Antropologia Cultural no Instituto Superior de Ciências de Educação de Cabinda (ISCED-Cabinda), o “pronunciamento do presidente Marcelo Rebelo de Sousa é oportuno porque a sociedade portuguesa nunca teve, mesmo depois da descolonização, momentos serenos para fazer uma avaliação profunda sobre essa temática, e até mesmo com as antigas colónias em África”. Com o pronunciamento de Marcelo Rebelo de Sousa, “houve esse momento para discutir abertamente, sem tabus, sobre esses passivos que nós identificamos, quer durante a escravatura assim como durante o processo da colonização. Houve muitos crimes hediondos, nessa altura”.
Relativamente às reparações, o mesmo académico considera que “depois das independências dos países africanos não se deve manter o complexo do colonizador ou do colonizado. É preciso manter uma cooperação entre Estados soberanos à margem desses complexos. Nessa perspectiva” Raul Tati diz que “daria razão a alguns sectores críticos a esse pronunciamento, devido a que não sabemos se se deve indemnizar ou não”.
“Os próprios países africanos, antigas colónias, deviam também aproveitar esta oportunidade para manifestar o que pensam, sobretudo os intelectuais e a classe política. O que pensam sobre esta provocação do Professor Marcelo Rebelo de Sousa”, sugeriu Raul Tati.
“Para os cabindas não está em causa uma indemnização pecuniária”
Durante a sua intervenção, o presidente português questionou se “há acções que não foram punidas e os responsáveis não foram presos” ou se “há bens que foram saqueados e não foram devolvidos”, tendo rematado, “vamos ver como podemos reparar isso”, reconhecendo que “pedir desculpas é a parte fácil”
Especificamente no caso de Cabinda, e de como Portugal poderá reparar os erros cometidos durante o período colonial, Raul Tati avançou que “para os cabindas não está em causa uma indemnização pecuniária, por supostos prejuízos causados pela colonização. Isto porque Cabinda, rigorosamente falando, com base nos factos da própria história, não foi uma sexta colónia portuguesa em África. Cabinda foi tida, desde o século XIX até ao 25 de Abril 1974, como um protectorado português. Não foi uma colónia!”.
“Como cabindas, nós queremos uma reparação moral de Portugal por ter traído o espírito e a letra dos Tratados com o povo de Cabinda. Para tal, bastaria que Portugal confessasse a sua culpa por ter abusivamente alienado o território de Cabinda, fazendo a sua integração na sua antiga colónia de Angola, no Acordo de Alvor de 1975”, disse o professor de História e Antropologia Cultural e antigo deputado da oposição no parlamento angolano, Raul Tati.
Tati também sustenta que a “reparação portuguesa” poderia traduzir-se em Portugal “prestar apoio político e diplomático às forças vivas e políticas cabindesas que ainda se debatem pelo resgate da sua soberania para que se reponha a justiça restaurativa, dando aos cabindas essa possibilidade do exercício do direito à autodeterminação. Este é o grande desafio que transmito à classe política portuguesa, ainda no rescaldo do pronunciamento do presidente Marcelo Rebelo de Sousa. Nós cabindas estamos atentos e continuaremos a cobrar a Portugal, uma reparação moral, mas não precisamos de uma indemnização pecuniária”, vincou Raul Tati.
RN