A um mês do início da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30), o Ministério Público Federal (MPF), o Ministério Público do Estado do Pará (MPPA), a Defensoria Pública da União (DPU) e a Defensoria Pública do Estado do Pará (DPE-PA) ingressaram na sexta-feira, 10 de outubro, com uma ação civil pública na Justiça Federal contra a União e o município de Belém.
Os órgãos pedem decisão urgente para obrigar os governos a cumprir normas que asseguram direitos fundamentais da população em situação de rua. Segundo a ação, a omissão das autoridades tem agravado a vulnerabilidade desse grupo, especialmente diante da proximidade da COP30, evento que já provoca especulação imobiliária e pode intensificar remoções forçadas.
O alerta central é para o risco de “higienização social”, prática proibida por decisão cautelar do Supremo Tribunal Federal (STF) na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº 976, que determinou uma série de proteções à população de rua em todo o país.
O documento é assinado pelo procurador regional dos Direitos do Cidadão, Sadi Flores Machado, pelo promotor de Justiça Firmino Araújo de Matos, pelo defensor público federal Marcos Wagner Alves Teixeira e pela defensora pública estadual Julia Graciele Rezende de Sousa. Eles relatam um “notório e expressivo aumento” da população em situação de rua em Belém — crescimento superior a 500% nos últimos oito anos, segundo levantamento do Observatório Brasileiro de Políticas Públicas para Pessoas em Situação de Rua.
Principais omissões
A ação judicial aponta cinco eixos de omissão estatal:
Ausência de dados oficiais – Dois anos após determinação do STF, o município ainda não realizou o diagnóstico obrigatório da população em situação de rua, previsto na Lei Municipal nº 10.152/2025.
Remoções e recolhimento de bens – Em junho, equipes municipais teriam retirado pessoas e pertences da Travessa Quintino Bocaiúva, em violação direta à decisão do STF.
Insuficiência de vagas de acolhimento – Inspeção conjunta em julho constatou redução da capacidade dos abrigos municipais de 54 para 40 vagas, apenas duas disponíveis no momento da vistoria.
Precariedade estrutural – Parecer técnico classificou a Casa Rua Nazareno Tourinho como “totalmente inadequada”, com riscos à segurança. Outros Centros de Referência Especializados (Centros Pop) apresentam falhas graves, como falta de acessibilidade.
Inércia nas políticas públicas – Embora Belém tenha aderido a programas federais como Ruas Visíveis e Moradia Cidadã, a ação afirma que não houve adoção de medidas concretas, e que a União oferece apenas apoio genérico, sem repasse técnico ou financeiro efetivo.
Pedidos de urgência
Os MPs e as Defensorias pedem que a Justiça determine, em até 15 dias, que o município de Belém: proíba remoções e recolhimentos forçados; elimine barreiras e estruturas hostis no espaço público; disponibilize banheiros, bebedouros, lavandarias sociais e itens básicos de higiene e promova mutirões de cidadania para regularização de documentos e inscrição em cadastros sociais.
Em até 30 dias, município e União devem realizar um diagnóstico socioterritorial da população em situação de rua, criar protocolo de atendimento integrado na rede pública de saúde e oferecer 250 vagas provisórias em casas de passagem.
A ação também requer que a União forneça apoio técnico e financeiro no âmbito do Programa Pontos de Apoio (PAR) e que o cumprimento das medidas seja acompanhado por relatórios mensais e audiência de monitoramento em 60 dias.
Medidas definitivas
No pedido final, os órgãos solicitam que a Justiça obrigue Belém a reformar e ampliar seus abrigos, criar novas casas de passagem e realizar o primeiro censo municipal da população em situação de rua. As ações devem ter previsão orçamental e financiamento federal, de modo a assegurar a execução contínua das políticas públicas de acolhimento.
A ação civil pública tramita na 1ª Vara Federal Cível da Secção Judiciária do Pará sob o número 1053723-12.2025.4.01.3900.
Ígor Lopes