Na abertura do Ano Judicial 2025 do Tribunal Africano dos Direitos do Homem e dos Povos, realizada nesta segunda-feira, o Presidente da República de Cabo Verde, José Maria Pereira Neves, destacou a importância das reparações históricas para o continente africano.
Num discurso enfático, Neves sublinhou que a questão das reparações transcende a mera compensação material e deve ser abordada de forma holística, abrangendo a educação, a cultura e a dignidade das populações afetadas.
“A questão das reparações transcende a mera compensação material. Insere-se numa perspetiva holística, que abrange os alicerces essenciais da saúde, educação e cultura, pilares imprescindíveis para a cura das feridas do passado e para a edificação de um futuro de equidade e prosperidade”, afirmou o chefe de Estado cabo-verdiano.
Neves alertou para as consequências dos conflitos que ainda persistem em várias regiões de África, como o Sudão, as fronteiras da República do Congo e o Sahel, destacando que a destruição vai além do dano físico, afetando estruturas sociais, econômicas e culturais. O presidente ressaltou que é essencial investir na educação e na cultura para reverter os danos causados.
“Nos momentos em que os conflitos eclodem, as escolas são frequentemente as primeiras a fechar. As crianças, privadas do direito à educação, tornam-se reféns da guerra, testemunhas da perda e vítimas da pobreza”, declarou Neves, reforçando que a educação é essencial para romper ciclos de violência e marginalização.
O Presidente de Cabo Verde também abordou a necessidade de valorizar a cultura africana como meio de preservação da identidade e fortalecimento social. Segundo ele, “a cultura é o fogo que mantém viva a identidade e a memória coletiva, garantindo que nenhum povo se perca no esquecimento”.
Outro ponto central do discurso foi o reconhecimento histórico da escravidão e dos impactos do tráfico transatlântico de escravos. Neves frisou que a exigência de reparações não se trata de reescrever a história, mas de garantir que os erros do passado sejam corrigidos por meio de ações concretas.
“Reparar significa agir. Não basta recordar os sofrimentos ou lamentar os erros do passado; é necessário traduzir este reconhecimento em iniciativas concretas que promovam o desenvolvimento inclusivo, a educação, a saúde e o fortalecimento das instituições de justiça”, reforçou.
Ao encerrar sua intervenção, Neves reiterou a necessidade de uma “segunda descolonização”, que liberte a África das dependências de narrativas externas e sistemas que perpetuam a desigualdade. Citando o ex-presidente de Gana, Nana Addo Akufo-Addo, afirmou que “este é o momento de a África também receber reparações”.
O discurso do Presidente de Cabo Verde ecoou entre os participantes da cerimónia, reforçando a necessidade de um compromisso coletivo para que a justiça reparadora se torne realidade e para que as futuras gerações africanas possam construir um futuro baseado na dignidade e no desenvolvimento equitativo.
Anícia Cabral – Correspondente