Paralisia cerebral em Portugal: panorama atual e desafios
A Paralisia Cerebral (PC) define-se como um conjunto de perturbações permanentes do movimento e da postura, devido a lesões ou malformações cerebrais, que podem ocorrer durante a gravidez, no parto ou nos primeiros anos de vida. Embora resulte de uma lesão não progressiva, as manifestações clínicas podem modificar-se ao longo do crescimento.
De acordo com o último Relatório do Programa de Vigilância Nacional da Paralisia Cerebral (PVNPC) em Portugal, publicado em janeiro de 2025, regista-se uma incidência estável de 1,7 casos por 1.000 nados-vivos nas crianças nascidas entre 2001 e 2015. A prematuridade continua a ser o principal fator de risco, uma vez que crianças nascidas com 28 a 31 semanas de gestação apresentam um risco 47 vezes superior ao das nascidas no final da gravidez (37 ou mais semanas), enquanto prematuros com menos de 28 semanas têm um risco 81 vezes superior. A idade materna avançada também se associa a maior risco de PC (50% maior nas mães entre os 40 e 44 anos e 3 vezes maior nas mães com mais de 44 anos). Outro fator de risco identificado foi o nascimento sem assistência adequada, ocorrido em casa, no transporte ou numa instituição de saúde sem maternidade. De acordo com este Relatório do PVNPC, também se associaram a um maior risco de PC as seguintes condições: ser o primeiro filho, ser rapaz, nascer com baixo peso para o tempo de gravidez e a presença de malformações congénitas. Para além dos fatores presentes à nascença, em 8% das crianças foi identificado um evento causador da PC após o 1º mês de vida, sendo exemplos uma infeção, complicação de intervenção clínica ou AVC.
Do ponto de vista funcional a limitação motora pode ser muito variável, desde incapacidade para se deslocar de forma autónoma com total dependência do cuidado de terceiros na alimentação, higiene e vestuário, até limitações muito subtis que escapam aos olhares menos conhecedores.
Cerca de metade das crianças com PC apresenta dificuldade em fazer-se entender pela fala fora do contexto familiar, assim é fundamental proporcionar meios alternativos e aumentativos da comunicação para promover a sua inclusão na escola e sociedade.
Apresentam compromisso cognitivo cerca de 60% das crianças/adolescentes com PC, pelo que é importante destacar que 40% têm boa capacidade de aprendizagem e ainda são muitas vezes vítimas de estigma pela sua limitação motora.
Apesar de não existir cura, uma intervenção precoce e multidisciplinar, individualizada e em ambiente lúdico, pode otimizar a funcionalidade e a qualidade de vida das crianças e adolescentes com PC. Neste acompanhamento são essenciais os médicos (neuropediatras, fisiatras, pediatras) e técnicos experientes (fisioterapeutas, terapeutas da fala, terapeutas ocupacionais, psicólogos, nutricionistas) em articulação com os educadores/professoras e a família. Em alguns casos, poderá ser necessário recorrer a medicamentos, uso de produtos de apoio ou intervenções cirúrgicas. Os principais objetivos são maximizar a independência funcional, prevenir complicações secundárias e promover a inclusão social e educacional.
A PC envolve também desafios emocionais e sociais, para o próprio, pais e irmãos saudáveis, mas também para a família alargada e amigos que devem procurar estar presentes e apoiar. A promoção da acessibilidade, apoio familiar e inclusão são determinantes para que a criança ou adolescente com PC supere as múltiplas barreiras e desenvolva plenamente o seu potencial.