Venâncio Mondlane é um político hábil, que recorre a ideias e métodos que misturam a teoria da desobediência civil, as justas queixas e expectativas de uma sociedade empobrecida – e injusta de inúmeras formas – e os meios de polarização usados pelos populistas e agitadores políticos: as redes sociais.
A desobediência civil é uma forma de protesto que é feita por meios pacíficos e que se opõe a uma ordem política injusta ou a um governo visto como opressor pelos desobedientes. Na época moderna, o seu teorizador foi Henry David Thoreau, mas quem melhor exemplificou a sua essência foi Mahatma Gandhi, no processo de independência da Índia, ou Martin Luther King Jr., na luta pelo fim da segregação racial nos Estados Unidos.
Mondlane defende duas ideias: a de que ganhou as eleições – e por isso pede a reposição da sua verdade eleitoral – e a de que o governo da Frelimo é ilegítimo e opressor – e por isso, não pode continuar a governar.
É evidente que as eleições tiveram inúmeras irregularidades, que foram aliás apontadas pelas várias missões de observação eleitoral. E que os resultados apresentados pela Comissão Nacional de Eleições favoreceram a Frelimo e o candidato presidencial Daniel Chapo. No entanto, é muito pouco provável que o partido Podemos e o candidato presidencial por si apoiado tenham ganho as eleições.
Estaremos, por isso, perante não uma, mas duas fraudes: uma executada por elementos da Frelimo, que empolaram indevidamente os votos do partido no poder, e outra por Venâncio Mondlane, que alega que venceu as eleições, sem o ter conseguido fazer e, muito menos, provar.
O que é certo é que nenhum dos dois quis repetir as eleições: por falta de confiança no sistema e nos resultados futuros, por receio que o Presidente cessante aproveitasse para prolongar o seu poder e porque o seu custo seria enorme.
Mondlane seguiu, então, um caminho perigoso: da desobediência civil legítima contra um ato eleitoral manipulado, mesmo que o resultado não lhe desse a vitória, passou a apelar à violência e ao caos. A defender uma revolução, para deitar abaixo um regime que diz ser ilegítimo.
Ora, o regime tem sido injusto para a maior parte da população, que vive na pobreza. Os membros da elite frelimista têm enriquecido e a corrupção graça no estado e nas empresas. Injusto, sim. Mas ilegítimo? Não há um só país no mundo sem corrupção. Quanto mais débeis as instituições, maior é a corrupção e o nepotismo. Moçambique tem instituições frágeis e o seu povo merece muito melhor. Mas não será o populismo de Mondlane, ou de qualquer outro homem providencial, que trará justiça aos moçambicanos.
Mondlane não é nem Mahatma Gandhi, nem Martin Luther King Jr.. É um político hábil que se está a aproveitar do momento para chegar ao poder. O Podemos foi a sua muleta. O Facebook a sua estratégia. Nenhum dos dois fortalecerá as instituições ou criará empregos. Pior, os seus apelos à violência são tão ilegítimos quanto os erros do governo de Filipe Nyusi.
Moçambique dirige-se para um precipício, conduzido por um homem bem falante. Não há primaveras no seu caminho. Só destruição e mais sofrimento. Se não for posto um fim à espiral da violência, os moçambicanos ficarão mais pobres e, quem sabe, um eventual regime político seguinte será verdadeiramente opressor. Não foi esse o fim das primaveras árabes?
Ainda há tempo para o diálogo. Entre todos e com todos. Para construir e não para destruir. Depende de Mondlane e de Chapo, desde logo. Mas também de todos os moçambicanos.