O jornal britânico independente The Guardian noticiou, na semana passada, que a violência sexual e de género está a intensificar-se na República Centro-Africana (RCA), acusando os mercenários russos pela crescente insegurança de mulheres e crianças no país. O cenário será dramático, com os casos de violações e de abuso sexual a repetirem-se dia após dia, afetando comunidades inteiras e aprofundando a crise humanitária.
De acordo com as Nações Unidas e outras organizações presentes no país, desde 2020, os incidentes aumentaram de cerca 9.200 para 25.500 casos relatados. A realidade será ainda mais preocupante, uma vez que a maioria das vítimas não relatará estes crimes devido ao estigma associado à violência sexual e à falta de apoio disponível.
As dificuldades para as vítimas em obter justiça são exacerbadas por um sistema jurídico frágil, com muitas mulheres que ousaram avançar a retirarem as queixas devido a pressões ou subornos.
Este não é um fenómeno recente na RCA, um país assolado por anos de conflito e instabilidade, e os relatos de violência sexual por parte dos mercenários russos (pertencentes ao grupo Africa Corps, organização que tem vindo a substituir o temido Grupo Wagner) são apenas uma parte do problema.
O sentimento de insegurança impede as mulheres e meninas de trabalhar nos campos e mercados, num país onde cerca de 75% da população, e particularmente as mulheres, trabalha na agricultura. O resultado é a diminuição de produtividade e a escassez de alimentos, que tem levado a um aumento dos preços na ordem dos 50% nos locais mais afetados.
A crise é também agravada pela falta de financiamento internacional para a violência sexual e de género. Segundo a ONU, o pedido de assistência humanitária para o país, de cerca de 14 milhões de dólares, recebeu menos de 15% do valor solicitado. A presença de mercenários russos, intimamente ligados ao governo, torna difícil justificar as doações, temendo que os fundos acabem por vir a apoiar essas forças.
A nova Constituição da RCA promete combater a violência contra as mulheres, mas a implementação efetiva dessas medidas ainda parece distante. O país continua a ser um dos lugares mais perigosos do mundo para as mulheres, onde a violência sexual e de género é uma realidade diária, e a esperança de justiça e segurança ainda é um sonho distante.