Guiné-Bissau: PAIGC ainda imune à estratégia dos Congressos para partir partidos

Guiné-Bissau sede PAIGC

Os inexpectaveis Congressos extraordinários nos partidos com assento parlamentar na Guiné-Bissau, fazem parte da estratégia encontrada pelo actual Presidente da República, Umaro Sissoco Embaló, para desestabilizar os seus opositores e angariar apoio dessas formações políticas para garantirem um segundo mandato.

Demonstrativo desta estratégia, todos os Presidentes saídos dos aludidos Congressos extraordinários, tais como no MADEM e no PRS, declararam um apoio incondicional ao segundo mandato. No entanto, esta vaga de Congressos extraordinários ainda não conseguiu atingir o Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC), partido o principal alvo por dois motivos.

O primeiro fator é o potencial do líder do PAIGC, Domingos Simões Pereira (DSP), principal adversário de Umaro Sissoco Embaló nas próximas eleições. O segundo motivo é o facto de o partido dos Libertadores ter condições para sair vencedor das eleições legislativas.

Desestabilizar o PAIGC é a meta. Através da mudança da direcção, probabilidade estatutariamente impossível nas circunstâncias actuais, ou da criação de uma direcção paralela, como presentemente acontece no PRS e MADEM. A última hipótese foi uma peça estrategicamente ensaiada, mas faltaram os “actores”.

O primeiro ensaio aconteceu com uma conferência de imprensa de altos dirigentes do PAIGC que integram o actual Governo de Iniciativa Presidencial, mas não teve os resultados pretendidos. Depois surgiu uma figura do partido, Armando Sanca, ex-membro do Conselho Nacional de Jurisdição do PAIGC que denunciou o que qualificou de atrocidades do presidente do partido.

Em apenas um mês Armando Sanca promoveu mais de quatro conferências de imprensa, sem que estas tivessem o impacto pretendido. Num efeito boomerang, os militantes do PAIGC não hesitaram em apontar o dedo acusador ao Presidente da República de estar, presumivelmente, atrás de Armando Sanca, como também da pressão sobre os membros do Governo, e o ex-porta-voz do PAIGC, João Bernardo Vieira.

Nos condimentos que enriquecem a estratégia na ofensiva ao PAIGC, estão também os reiterados impedimentos de realização de encontros políticos dos Libertadores e da Coligação PAI-Terra Ranka, assim como empossamento da segunda vice-presidente da Assembleia nacional Popular (ANP), Satú Camará como Presidente do parlamento, bem como a restrição de viagens imposta ao Presidente do PAIGC.

Internamente, as acções de desestabilização poderiam ter mais impacto, com onda de acusações a subir de tom. Foi apontado a João Bernardo Vieira de ter facilitado as condições para destabilização quando anunciou ter desistido da candidatura nas próximas eleições legislativas e acusou o Domingos Simões Pereira de egoísmo e manter o seu nome como candidato a deputado, quando todo o seu desejo é ser Presidente da República.

“Mais uma vez, o putativo candidato do PAIGC às eleições Presidenciais de 2025, colocou o seu nome na lista de candidatos a deputados para continuar a ser deputado nas eleições legislativas de 2024. Aí Deus! Tamanha ganância. Mais um insulto à nossa consciência colectiva. Isto é tudo menos racionalidade! E ainda assim, existem pessoas que nos querem fazer acreditar que nós é que estamos errados. Cruzes! Somos contra qualquer congresso extraordinário no seio do PAIGC, porque o partido tem os seus estatutos e devemos respeitá-lo. Contudo, ver um homem a manipular a consciência de todos é de facto insuportável e intolerável”, escreveu João Bernardo Vieira a 11 de Outubro.

De todos os focos de contestações, a mais consistente é de João Bernardo Vieira, tendo em conta que foi uma das figuras mais próximas de Domingos Simões, quando este chegou a liderança do partido.

Depois de uma travessia do deserto no interior do partido, João Bernardo Vieira, voltou a ser uma preocupação dos dirigentes do PAIGC quando escreveu uma Carta Aberta ao Presidente da República a pedir o adiamento de eleições, devido ao ambiente político. A carta teve o efeito perverso com dirigentes do PAIGC e seus apoiantes reforçarem a convicção de que João Bernardo Vieira estaria ao serviço de Sissoco Embaló.

Na mesma semana, para além da conferência de imprensa de Armando Sanca, os dirigentes do PAIGC integrantes do Governo dirigiram uma carta ao presidente do partido a pedir para que este clarificasse a questão da cabeça de lista nas legislativas, e se DSP se assume também como candidato presidencial.

No dia seguinte, os signatários da carta foram convocados à sede do PAIGC para uma reunião, na qual, Domingos Simões Pereira assumiu ser ele o candidato a Primeiro-ministro, conforme o plasmado nos estatutos do PAIGC e que, em caso de impedimento, o mesmo instrumento interno prevê condições de substituições. No mesmo encontro, os contestatários acataram os esclarecimentos reservando as suas posições para as reuniões dos órgãos.

A 29 de Outubro o PAIGC reuniu o Comité Central para analisar a situação política do partido e “as bolsas de resistência interna”. No final, Domingos Simões Pereira saiu mais reforçado. Entre os 347 participantes, um voto foi contra em manter confiança em DSP, e duas figuras abstiveram-se. Com esse voto, que reforça até às eleições a confiança no actual líder, as estratégias de desestabilização do PAIGC ou de obtenção de aliados através de facções, está cada vez mais difícil.

Mas, as ofensivas ainda não pararam. No dia 30, o Presidente da República voltou a reunir com os elementos do PAIGC que integram o Governo. Um novo plano estará em curso.

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